quarta-feira, 20 de maio de 2009

Mallu Magalhães - Um fenômeno

No Grammy Awards de 2005, foram escaladas para o tradicional tributo que a academia de música faz todos os anos às grandes figuras da música, Joss Stone e Melissa Etheridge. Comentarista da premiação naquela noite, o músico e dono da gravadora Trama João Marcelo Bôscoli comentou que não fora uma escolha feliz colocar as duas cantoras para dividir o palco sob a responsabilidade de homenagear ninguém menos que Janis Joplin. A observação de Bôscoli estava ali para tentar explicar o constrangimento que a apresentação de Joss frente à da Mellissa; para ele, a primeira tinha sim seu talento, mas lhe faltavam ainda a maturidade e experiência pessoal que, para o músico se faziam necessários para sustentar a lenda de Joplin.
O raciocínio de Marcelo Bôscoli se apoia numa abstração: não se pode separar a arte da experiência humana do artista, o que quer dizer algo como a arte deve ser um relance do peso da experiência de existir. Faz sentido. Arte tem a ver com emoções, auto-exposição e com a sensibilidade de tomar como seus os sentimentos das outras pessoas (o bom o velho "o poeta é um fingidor"). A pouca idade e o frescor de Joss não poderiam nunca sustentar o trágico no furor de Janis Joplin.

Nos chamados "10 meses que abalaram a música brasileira", conhecemos os quinze anos de Mallu Magalhães que, ao contrário das outras mocinhas da sua idade, não sonhava em ter uma banda de hardcore melódico e não era fã de Malhação. Gosta mesmo é de se meter entre os vinis do Johnny Cash, do Elvis e do Bob Dylan, heranças do pai. Em uma relativamente rápida progressão, Mallu saiu do nicho MySpace para ganhar posições nos charts de música e se tornar conhecida como revelação folk nacional, tão pronta para exportação quanto o pessoal do CSS.



Fala-se de sua segurança no palco e a segurança de um cantar sozinho no palco com seu instrumento significam ou sua consistência musical ou sua enorme pretensão. A dúvida só pode ser tirada pelo tal raciocínio abstrato de Marcelo Bôscoli: o que acontece quando a arte e o artista se encontram produzem uma coisa que não dá pra saber o que é, mas causa arrepios. Mas Mallu Magalhães continua sendo só uma menina, e a sua biografia não é blues como a de uma Billie Holiday para que saia executando canções com a força que executa, com os ligeiros arrepios que causa. Talvez esteja aí a chave de tanta curiosidade em cima da cantora porque, não, ela não tem idade para ser artista no sentido mais romântico que isso costuma ter, mas ela é. O seu blues é o puro peso da idade em que, juramos de pés juntos, estamos, ao mesmo tempo, prontos para o mundo e aprisionados por ele – o peso de ser destemido, o peso de ser intocável.

O entusiasmo por Mallu Magalhães faz parte desses acontecimentos estranhos que assaltam o mundo de tempos em tempos: pessoas de sensibilidades precoces, com aptidão para desenvolverem muito cedo certos talentos e que, quando os expõem, impressionam pela grande inteligência que parece queimar etapas do desenvolvimento. Os prodígios nos enchem de curiosidade e revelam as ricas possibilidades da mente e das emoções humanas.

Multi-instrumentista, ela toca violão, banjo, gaita, escaleta e está aprendendo o piano. Mallu também compõe as próprias músicas, a maioria em inglês, por achar a língua mais melódica e menos difícil de domar dentro das canções. Mas também tem seus momentos no português e no francês. Vinda da classe média alta, a menina sempre teve o apoio e incentivo dos pais para cultivar e multiplicar sua doce criatividade.

A agenda de concertos cresceu absurdamente nos últimos dois meses, as entrevistas também. Mallu continua conversando com todos e respondendo às perguntas num misto de timidez e raciocínio tão rápido que a fala não consegue acompanhar, mas quando pega o violão e começa a cantar a mudança é de deixar desnorteado. A voz doce, a habilidade e intimidade com os instrumentos revelam algo que é difícil de explicar. E música poderosa nascendo do que parecia ser apenas uma menina.

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