quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Salve 2010!



Para abrir os trabalhos do blog em 2010, posto aqui um texto espirituoso de Daniela do Carmo, com o título "Multidão".

Você já esteve em um lugar cheio e achou que era você e um bloco maciço de gente ao redor? Pois não é. As pessoas são como mármore: parecem duras vistas de fora, aos olhos de um leigo, mas são porosas, frágeis, feitas de sedimentos construídos de vários pedacinhos minúsculos. Todas têm a mesma condição humana de serem pequenas e grandiosas.

Em uma multidão, se estivéssemos em um desenho animado, veríamos balões indicando os pensamentos. E onde tem pensamento, tem preocupação. Estou gorda? Estou conseguindo? Por que ela está aqui? Tomara que passe rápido, quero logo chegar em casa. Eu não deveria ter bebido tanto. Eu não vou chorar. Mas que vadia! Sério, esse papo não vai acabar nunca mais? Why???

A variedade de circunstâncias e situações é imensa, cada um vive seu horror e sua felicidade particular, com um mar de testemunhas ignorantes por todos os lados. Ninguém sabe a sua dor, ninguém deve saber. Há quem só queira ser amado, quem precise de perdão e quem tenha esquecido o caminho de volta para casa. Há quem não entenda muito bem o que está acontecendo e quem não tenha condição de entender, por ter a cabeça vazia demais. Esses são os pobres-coitados, que não saberão jamais. Há quem só precise de um minuto de trégua, um minuto de descanso, por ter a mente cansada demais.

A sociologia explica o comportamento das massas, mas nada explica a solidão que se sente em meio a tanta gente. No final das contas, todos, sem exceção, somos criaturas falhas e cheias de amor pra distribuir, carentes de amor para receber, todos queremos só mais uma chance, mais uma, e outra, e mais uma e sempre. É o que nos une, o que nos nivela, o que nos motiva e o que nos cura: a impagável possibilidade de fazer direito de novo, só mais uma vez.

Já foi o tempo em que eu me sentia sozinha estando rodeada de gente. Hoje me sinto inteira, perplexa, íntegra, grata, unida e espectadora feliz por pertencer a esse fenômeno que é ser humana. Não sou diferente de ninguém, nem igual. Sinto a dor e o drama do outro, vejo em raio-x o que acontece, contemplo a tudo e choro de emoção. Não posso ajudar, posso só estar junto e torcer para que caia do céu o perdão, o entendimento, a noção e o amor. Não, o amor não precisa brotar do céu, basta consentir que ele sairá livremente de dentro, e isso já estará de muito bom tamanho.

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